segunda-feira, 28 de abril de 2014

A sociedade como um esquema de pirâmide

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Quem não conhece alguma pessoa que foi persuadida a participar de algum esquema de pirâmide como Herbalife, Telexfree, BBom, MonaVie e similares, torrando toda ou boa parte de suas economias, seduzida pelas inúmeras e tentadoras promessas de sucesso e riquezas? 

A maioria de nós conhece alguém que já caiu nesse tipo de furada; Geralmente contamos piadas sobre essas pessoas, classificando-as como vítimas de sua própria ganância ou ignorância. O problema é que você, meu caro, está participando ativamente do maior, mais bem arquitetado, mais sórdido e mais perverso esquema de pirâmide que já existiu e, ainda por cima, foi condicionado a amar muito tudo isso.

Primeiramente, vamos definir exatamente do que se trata esse tal de esquema de pirâmide, que muita gente já ouviu falar mas não sabe muito bem o que é. 

Nos esquemas de pirâmide convencionais, em média, somente 1 entre cada 300 participantes, consegue apenas recuperar seu investimento. 1 entre cada 3.000 participantes consegue recuperar seu investimento com uma pequena margem de lucro, e 1 entre cada 30.000 participantes consegue obter lucro significativo. Ou seja, entre 30.000 participantes, 100 apenas recuperam o investimento, 10 obtêm um pequeno retorno e apenas 1 obtêm lucratividade realmente vantajosa. Os outros 29.889 saem no prejuízo.

Este único indivíduo, o qual, dentre os outros 30.000, atingiu o patamar no qual  pode ser considerado como bem sucedido, tem então sua imagem explorada da maneira mais ampla o possível através dos diversos veículos de comunicação disponíveis servindo como isca para atrair um número cada vez maior de participantes, que derramam suas economias no esquema inspirados por sua imagem de sucesso.


Podemos dizer então que um esquema de pirâmide bem estruturado cria a ilusão de que é extremamente viável e possível atingir um objetivo que é, probabilisticamente, praticamente inalcançável, explorando os resultados obtidos pelos participantes com a finalidade de enriquecer seus idealizadores em detrimento de todo o resto.

O que isto tem a ver com a nossa sociedade? Tudo, exceto pela escala em que o golpe é aplicado, que é global. Para se ter uma ideia, um relatório recente feito pela ONG britânica Oxfam, demonstra que o patrimônio das 85 pessoas mais ricas do mundo equivale às posses de metade da população mundial.

Você consegue ao menos vislumbrar o escopo desta discrepância? Provavelmente, não. Se cada um de nós conseguisse assimilar verdadeiramente este absurdo, haveria uma revolução popular global de dimensões nunca antes vistas na história da humanidade.

O que torna a atual situação tolerável e impede uma explosão popular global de revolta é a constante esperança ilusória de subir na vida, que é alimentada e renovada constantemente por técnicas propagandistas incessantemente veiculadas através dos meios de comunicação, os quais estabelecem que o modelo de uma pessoa bem-sucedida é o modelo de uma pessoa extremamente rica. Todo mundo foi ensinado desde criancinha a querer ser este modelo, que ser nobre é não medir esforços para tentar atingir tal patamar e que a máxima honraria social reside no ato contribuir ao máximo para o mover da economia.

O problema é que mídia não costuma mostrar que, dentre 7 Bilhões de pessoas que existem no mundo, aproximadamente 12 milhões conseguem atingir este patamar de riqueza e se tornar milionários. O número de Bilionários varia muito, mas fica em torno dos 2 mil, que valem entre si mais que o dobro do PIB anual dos Estados Unidos. O resto, aproximadamente 99,83% da população mundial, morre tentando, ou melhor, vive tentando e se mata no processo no qual é explorado como uma bomba humana de transferência de riqueza, da base para o topo da pirâmide.

Outro ponto importantíssimo no contexto desta discussão é elucidar que toda riqueza que existe no planeta é constituída essencialmente pelos recursos. Apesar da quantidade de dinheiro em circulação oscilar devido à inúmeras variáveis, vivemos em um único planeta com uma quantidade "x" de recursos, os quais tem que ser distribuídos por uma quantidade "x" de indivíduos. O dinheiro, a moeda, somente representa estes recursos e funciona como facilitador. Para fins de sintetização, podemos dizer que existe uma quantidade relativamente linear de recursos no planeta, para ser distribuída entre uma população cada vez maior.

A expressão transferência de riqueza é crucial para conseguir enxergar como funciona a sociedade, substituindo uma outra expressão que é comumente, mas erroneamente, utilizada neste contexto, que é a geração de riqueza. Riqueza, fundamentalmente, não é gerada; é transferida.

Figurativamente, as coisas funcionam como em uma mesa de pôquer. Para que um jogador saia verdadeiramente vitorioso, possuidor de uma montanha de fichas, outros tem que sair sem nada ou com no mínimo muito pouco. O jogador vitorioso, neste caso, não gerou fichas; as fichas de todos os outros jogadores, os perdedores, foram transferidas a ele.

O mover da economia, é nada mais nada menos do que o movimento gerado pela transferência de riquezas, e é realizado por você enquanto trabalha, consome, paga impostos e faz dívidas. É com este movimento que você, não importa qual posição profissional ocupe, contribui para a extração, processamento, transformação, preservação e transferência de recursos. Quanto mais você trabalha, estimulado pela ganância que o motiva a querer ser o modelo de sucesso estabelecido pela mídia e apavorado pelo que as pessoas pensarão de você caso eventualmente fracasse, mais recursos você processa e transfere ao topo da pirâmide.

O problema, meu caro, é que como demonstrei nos parágrafos anteriores, você não tem uma noção realista do quanto é improvável, do quanto são ínfimas as chances de que você se torne um milionário. A propaganda que vem te condicionando desde criança a acreditar que é possível prejudicou gravemente a sua capacidade de julgamento, deliberadamente, claro. Realisticamente, é muito mais provável que você, independentemente de seus esforços, empobreça ao invés de enriquecer. De fato, se você pertence a classe-média, as chances são maiores de que durante a próxima crise você se torne um mendigo (e sempre haverá uma próxima crise). No entanto, para que a economia global continue seguindo seu curso e as riquezas continuem fluindo até o topo, é necessário que você acredite, que tenha esperança. É assim que a roda gira.

Vivemos em um mundo no qual menos de uma centena de pessoas possui, virtualmente, poderes divinos dentro da esfera social, política e econômica global; são oniscientes, onipresentes, onipotentes dentro deste contexto, e ainda por cima se reúnem anualmente para planejar a manutenção e expansão de sua hegemonia global. Estas pessoas, dentre várias outras coisas, controlam o que você pensa através da mídia, da qual são proprietárias, construindo e disseminando modelos de padrões de sucesso que são, na realidade, inatingíveis para 99,83% da população global. No entanto, estes modelos de sucesso são enaltecidos e propagados pela mídia de maneira extremamente intensa e desproporcional, persuadindo a população a crer que, caso se esforcem suficientemente, podem atingir o mesmo patamar, o que é, em todas as instâncias, uma grande mentira perante ao fato de que simplesmente não existem recursos o suficiente para que todas as pessoas do mundo se tornem milionárias, aliás, não existem recursos suficientes nem para que toda a população mundial viva nos padrões de um modelo modesto de classe-média, como o de países em desenvolvimento. Isso tudo quer dizer que, para pouquíssimos terem muito, muitos têm que ter pouquíssimo; Esta é a característica fundamental de qualquer esquema de pirâmide: A insustentabilidade.

Fala-se muito em sustentabilidade mas é tudo conversa para boi dormir, tanto do ponto de vista econômico, social ou ecológico. Fala-se muito em eventualmente reduzir ou até erradicar a pobreza, mas nas atuais circunstâncias, isso é impossível.

Acredite; Se houvesse uma maneira viável de eliminar a pobreza sem também eliminar a riqueza, a pobreza já não existiria há tempos

Portanto, meu amigo, trabalhe menos, consuma menos, pense mais. Não se deixe enganar pela propaganda que diz que você deve ter orgulho de contribuir para o mover da economia, porque no final do processo você só fica com as migalhas e quando perceber isso provavelmente já estará velho demais. É uma cilada.

Aprenda a viver com menos. Repense seus valores. Não seja escravo de um padrão de vida muito alto. Evite fazer dívidas. Ao deitar a cabeça no travesseiro, ao invés de pensar sobre o que você faria caso se tornasse um milionário de um dia pro outro, sonhe em ser uma pessoa melhor, um marido mais afetuoso, um pai mais compreensivo, um vizinho mais solidário, em aprender um instrumento musical ou uma nova língua...Existem mil coisas que só dependem de você para acontecer, que te trarão resultados certos, duradouros, altamente satisfatórios e que o tornarão um ser humano mais completo e mais feliz. Faça qualquer uma dessas coisas, mas não jogue sua vida fora tentando ser rico, porque é muito mais provável que você torre sua vida toda tentando e ainda faça papel de palhaço anônimo perante os olhos daqueles que realmente se beneficiam de seus esforços mas nem sabem que você existe.